Stéphany Franco1
Thiago Abreu2
Nesta data, mais do que nunca, vale ressaltar que o combate à LGBTfobia depende de mudanças estruturais. Nossa sociedade tem relativizado o preconceito em diferentes âmbitos. Até quando vamos permitir que milhares de brasileiros sofram diariamente apenas por serem quem são ou por demonstrarem afeto por pessoas do mesmo sexo?
O Brasil é considerado o país que mais discrimina e mata pessoas LGBTs no mundo. Combater a LGBTfobia é urgente e fundamental para a construção de uma sociedade livre de preconceitos e igualitária, independente de gênero sexual.
Infelizmente, estudos apontam que o Brasil caminha a passos lentos para ser um país livre de preconceitos, mesmo com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que, há dois anos, criminalizou a homofobia e a transfobia.
A LGBTfobia deixa marcas profundas e que afetam a vida das pessoas por muito tempo. Confira o relato de três jovens, militantes do movimento LGBT Socialista do PSB RS, que durante a adolescência sofreram com a “culpa”, exclusão social e a incompreensão da igreja.
Moradora de Rio Grande, aos 29 anos, Lirielem da Silva (Elinha), ainda convive com os reflexos do preconceito que sentia durante a fase escolar. Elinha é lésbica, casada e uma talentosa jogadora de futebol do Esporte Clube Pelotas. Hoje, Elinha não admite que a sua trajetória seja minimizada pelo preconceito. “Tudo o que eu passei faz parte da minha história, mas a minha história não se resume a isso”, revela, fazendo referência às agressões físicas e verbais que, por vezes, sofreu.
1 Jornalista e Assessora de comunicação do PSB no Rio Grande do Sul.
2 Secretário Estadual do LGBT Socialista| Biólogo e Pedagogo | Pesquisador em
Educação e Saúde.
Para Elinha, um dos principais desafios da população LGBT é a falta de empatia dos próprios familiares. “Em alguns momentos, pra eu ter o respeito da minha família, eu tive que trabalhar duro e ser reconhecida pela sociedade para depois ser reconhecida em casa”, lamenta. Porém, agora, com mais maturidade, ela reconhece que muitas atitudes de sua família eram para protegê-la. “Infelizmente, a comunidade LGBTQIA+ ainda é bastante vulnerável – principalmente – porque falta representatividade na política, na TV e no meio acadêmico, por exemplo”.
Elinha cresceu ao lado de duas irmãs e nunca despertou sentimentos pelo sexo oposto. Enquanto as irmãs apresentavam seus namorados à família, que é frequentadora da igreja evangélica, ela passava por conflitos internos.
“Eu até tive um namoradinho na minha adolescência, mas depois eu percebi
que não estava feliz levando a vida como as pessoas queriam. Decidi me
colocar em primeiro lugar e ser feliz”.
Já Gabriel Lourenço, de 24 anos, sempre se sentiu atraído pelo mesmo sexo e, pelas imposições da sociedade, convivia com a insegurança e o preconceito. “Eu sempre fui gay. Hoje, eu amo o meu corpo masculino, mas,
também, amo poder me vestir como eu tiver vontade e expressar os meus sentimentos através da moda”.
Lourenço, que foi o terceiro candidato a vereador mais votado pelo PSB em Taquari, é vendedor em uma loja de sapatos na cidade e, mesmo com a evolução da sociedade, vê diariamente o preconceito velado no ambiente de trabalho. “No geral, me sinto muito bem no meu trabalho. Mas claro que tem vezes que a gente percebe olhares e pessoas que preferem ser atendidas por
outro(a) vendedor(a) do que por mim”, conta.
O jovem, que nos finais de semana tinha a casa dos amigos como refúgio, cresceu em uma família extremamente religiosa e com a incompreensão do pai. “Eu sempre acreditei muito em Deus, mas com o tempo, a igreja começou a me podar e eu preferi me afastar para poder me redescobrir e me aceitar como eu sou”.
A fé também sempre guiou os caminhos de Thalles de Souza que, dos 13 aos 18 anos, frequentava a igreja com a certeza de que seria “curado”. Ele ia aos cultos da igreja evangélica, lia a bíblia, fazia tudo o que os pastores orientavam e, no final, se sentia culpado por sentir desejo por outros homens. “Desde pequeno, eu lembro de me sentir mais atraído por meninos do que por meninas e, ao invés de ser acolhido pelas professoras, elas chamavam a minha atenção e diziam que aquilo era errado”.
Souza, que hoje é professor e pesquisador, acredita que se destacar nos estudos foi a forma que encontrou de ser aceito pelos colegas que cometiam bullying com ele. “Passei por momentos que eu não me aceitava, mas isso aconteceu porque eu não me sentia aceito pelas pessoas. Foi um longo e doloroso processo de aceitação e autoestima”.
Morador de Pelotas, Souza acredita que a mesma fé que o fez ter inúmeros questionamentos na adolescência, é a que o libertou para ser quem ele é hoje. “Entendo que a minha família sempre quis me proteger, evitar que eu sofresse, mas não podemos fechar os olhos para o preconceito”, pondera.
Em um país considerado cristão, essas histórias – marcadas pelo conflito religioso – se confundem com a realidade de muitos brasileiros. É por essas e outras inúmeras histórias que o dia 28 de junho marca a incansável luta da população LGBTQIA+ por igualdade, aceitação e respeito.